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Recentes decisões proferidas pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) envolvendo a aplicação do artigo 124 inciso XXIII da Lei de Prop

por Ana Lucia de Sousa Borda

01 de junho de 2005

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De acordo com o previsto no artigo 124 inciso XXIII da LPI não são passíveis de registro como marca, sinais que reproduzam, no todo ou em parte, marca que o interessado, em razão mesmo de sua atividade, não poderia alegar que desconhece, e que, além disso, se destine a identificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim. Marcas nessas condições podem induzir o consumidor em confusão ou associação com a marca do verdadeiro detentor.

Dispositivo inovador em relação àqueles que já haviam tratado de proibições de registro de marcas, o referido artigo foi introduzido em nosso ordenamento jurídico com o advento da Lei no. 9.279/96 ­ Lei de Propriedade Industrial ­ LPI -, ou seja, da lei que, dentre outros, regula o registro de marcas de indústria e comércio.

A sua aplicação na prática tem servido como um importantíssimo instrumento de repressão à usurpação de marcas conhecidas e, por conseguinte, à prática de concorrência desleal. Como exemplo, podemos citar recentes decisões que resultaram na recusa dos pedidos de registro de nos. 811898806 e 811988821 para as marcas "AZZARUS" e "ASARO", respectivamente.

Sabedores de que a reprodução fiel de marcas conhecidas seria facilmente percebida e de pronto rechaçada, os requerentes de má fé mascaram sua verdadeira intenção. Tomando por base as marcas que buscam imitar, introduzem algumas modificações por meio da substituição de alguns elementos ou pelo acréscimo de outros.

Esse "disfarce" é claramente percebido ao confrontar-se as marcas "AZZARUS" e "ASARO" com a marca "AZZARO", amplamente conhecida no segmento de artigos de perfumaria.

A recusa de marcas como "AZZARUS" e "ASARO" com base na conhecida marca "AZZARO" também mediante a aplicação do artigo 124 inciso XXIII da LPI derruba por terra o argumento comumente utilizado no passado por requerentes de má fé. Em sua defesa, alegavam o desconhecimento da marca que na verdade queriam usurpar. A semelhança da marca supostamente nova com a marca imitada ou reproduzida seria decorrente de uma espantosa coincidência.

Melhor sorte também não tiveram aqueles que de má fé requereram o registro das marcas "DIVANI&DIVANI", "CAESARS PALACE", "BACACHARI","OVOTHERM"e"THEMAGICTOUCH" apenas para citar alguns exemplos. Assim, por força do disposto no artigo 124 inciso XXIII da LPI, presume-se que os requerentes de tais denominações conhecem as marcas que em verdade estão tentando reproduzir ou imitar. Independentemente de qualquer alegação que façam ou não, a lei simplesmente parte do pressuposto de que os requerentes de má fé são conhecedores de tais marcas.

Ainda citando o caso "ASARO", o Instituto Nacional da Propriedade Industrial ­ INPI ­ reconheceu a procedência dos argumentos do titular da marca "AZZARO", aduzindo em seu parecer que a marca ASARO "(…) é semelhante à marca "AZZARO" notoriamente conhecida em seu ramo de atividade, acarretando na prática desleal de concorrência mercadológica. Em razão de sua atividade, a Oposta (requerente da marca ASARO) não poderia desconhecer a existência da marca registrada pela Opoente".

De fato, agiu bem o legislador ao presumir que aquele que atua em determinado segmento conhece as marcas que nele se destacam, isto é, as marcas notoriamente conhecidas. Ao tratar dos Crimes Contra a Propriedade Industrial o legislador foi mais além, ao prever um aumento das penas de detenção de um terço à metade se a marca reproduzida ou imitada for notoriamente conhecida. Portanto, vasto é o alcance da norma objeto deste artigo não apenas na esfera administrativa como também na esfera judicial (cível e/ou criminal).

Marcas notoriamente conhecidas são aquelas que lograram alcançar alto grau de reputação em seu segmento específico. No entanto, seu conhecimento é presumido dentro de sua área. É importante que fique claro esse conceito, para que não se estabeleça confusão com a marca de alto renome, cuja proteção se estende a todos os ramos de atividade. As marcas de alto renome são, portanto, objeto de proteção ainda mais robusta do que aquela assegurada às marcas notoriamente conhecidas.

A proteção assegurada pelo dispositivo em questão às marcas notoriamente conhecidas em seu segmento esvazia, na mesma proporção, eventuais argumentos que os requerentes de má fé pudessem aduzir em sua defesa. Esse dispositivo consiste, assim, em um valioso instrumento no combate a tentativas de usurpação por parte de concorrentes desleais. Sua constante aplicação desde a introdução da LPI já resultou na formação de uma consistente jurisprudência, que serve como mais um elemento de repress ão à concorrência desleal.

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Ana Lucia de Sousa Borda

Socia, Advogada, Agente da Propriedade Industrial

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