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Busca por tratamentos contra a COVID-19 movimenta setor de tecnologia farmacêutica

por Pedro Moreira

14 de maio de 2020

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No mundo, universidades e empresas farmacêuticas e de biotecnologia estão em intenso processo de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de tratamentos, equipamentos e vacinas para prevenir e/ou tratar o coronavírus, sendo eles totalmente novos ou já existentes, mas agora direcionados a um novo uso, uma nova aplicação, contra o COVID-19.

As fases de P&D são as mais variadas: alguns tratamentos, equipamentos e vacinas ainda estão em investigação teórica e de bancada como, por exemplo, a avaliação de uma terapia hiperimune TAK-888 da empresa Takeda, parcerias entre as empresas Johnson & Johnson e Sanofi com a Autoridade Biomédica de Pesquisa e Desenvolvimento Avançado (BARDA) para identificar moléculas, e um novo uso de terapia combinada de fármacos lopinavir/ritonavir da empresa AbbVie.

Outros estão mais adiantados, em fases clínicas iniciais como, por exemplo, novos usos dos medicamentos Remestemcel-L (células-tronco mesenquimais humanas) e Actemra (tocilizumabe) das empresas Mesoblast e Roche, respectivamente.

Também já existem aqueles em fases clínicas mais avançadas, implementando testes em humanos em pequena escala como, por exemplo, o tratamento imunoterápico APN01 de uma forma proteica recombinante da empresa Apeiron Biologics, e testes em humanos em larga escala como, por exemplo, um novo uso do fármaco remdesivir da empresa Gilead Sciences, e o desenvolvimento da vacina potencial de mRNA e da vacina INO-4800 das empresas Moderna e Inovio Pharmaceuticals, respectivamente.

No Brasil, o Ministério da Saúde tem acompanhado P&D de pelo menos nove ensaios clínicos acerca do uso de alternativas já existentes, mas, agora, direcionadas ao tratamento contra o COVID-19, com a participação de centros de pesquisas, universidades e hospitais como, por exemplo, a “Coalizão Covid-19 Brasil” formada pelos hospitais Albert Einstein, HCor, Sírio Libanês, Moinhos de Vento e Alemão Oswaldo Cruz, e pelas Rede Brasileira de Pesquisa em Terapia Intensiva (Rede BRICNet) e Beneficência Portuguesa de São Paulo.

As expectativas de sucesso até o fim de 2020 são bastante otimistas e próximas da realidade. A corrida pela vida é clara, essencial e principal, mas não há de se negar o efeito colateral comercial e financeiro que uma nova tecnologia farmacêutica que tenha resultados de fato eficazes contra o COVID-19 poderá gerar. Seriam vendas globais, em quantidades inimagináveis, como nunca antes visto. Falar em dinheiro neste momento pode soar como insensível ou desumano, mas P&D farmacêutico é extremamente custoso, sendo necessário pelo menos que se vislumbre algum ganho financeiro para rodar a engrenagem da busca por novas tecnologias. Aqueles que atuam ou conhecem a área sabem que não existe fazer ciência e desenvolver inovações sem uma forte injeção de recursos humanos qualificados e investimentos altíssimos.

Imaginem quem for bem-sucedido em desenvolver estes novos tratamentos, equipamentos e vacinas e patenteá-los, ou seja, ter o direito de impedir que concorrentes e quaisquer terceiros possam fabricá-los e comercializá-los durante 20 anos, sem a sua prévia autorização? Além do ganho com uma produção própria e exclusiva, o proprietário da patente ainda poderia “alugar” a sua patente para terceiros autorizados, mediante o pagamento de royalties, e/ou transferir o conhecimento técnico relacionado, em combinação com fatores de produção, através de acordos de licenciamento de patente e transferência de tecnologia.

Por exemplo, no final de março, um oligômero de DNA direcionado ao COVID-19 já teve sua solicitação de patente apresentada por um pesquisador na Coreia do Sul. E se este produto biotecnológico comprovar ser eficaz e a respectiva patente for concedida?

Antecipando-se à maioria dos países no mundo, o Governo Federal, por meio do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), publicou no dia 7 de abril deste ano um procedimento especial para aquelas solicitações de patente cujo objeto seja relacionado com a prevenção e/ou o tratamento do COVID-19. Estas solicitações deverão ser submetidas ao Instituto até 30 de junho de 2021 e terão um tratamento diferenciado no Instituto, priorizando os trâmites processuais para obter-se a patente. A experiência neste tipo de tratamento diferenciado tem mostrado patentes sendo concedidas pelo INPI dentro de seis meses a 4 anos, enquanto que patentes farmacêuticas emitidas pelos trâmites regulares levam de 10 a 12 anos.

O foco do INPI, aqui, é tentar estimular pesquisadores e empresas a intensificarem P&D contra o COVID-19, de modo a chegar-se em alguma solução que freie ou até acabe a pandemia do novo coronavírus. Ainda nesta linha, o INPI também lançou, em março, o Observatório de Tecnologias Relacionadas ao COVID-19. Nessa plataforma, poderão ser encontradas as mais variadas tecnologias que possam contribuir no enfrentamento do novo coronavírus como, por exemplo, vacinas, fármacos, medicamentos, testes para diagnóstico, máscaras, equipamentos de saúde, dentre outros.

Cabe lembrar que, na indústria farmacêutica, o desenvolvimento de novos e aperfeiçoados produtos, processos de produção e equipamentos é tipicamente classificado como uma inovação radical ou incremental. As definições e os limites de cada um dos tipos de inovação são controversos e incertos, mas, de uma forma geral, há o consenso de que as radicais compreendem tecnologias inéditas ou revolucionárias (por exemplo, novas moléculas) e as incrementais compreendem melhoramentos em tecnologias existentes e estabelecidas (por exemplo, novas indicações terapêuticas e equipamentos aperfeiçoados). Ambos os tipos podem ser patenteados no Brasil de acordo com a atual Lei de Patentes.

O COVID-19 está em xeque no mundo. Crises podem gerar oportunidades comerciais e, especialmente no campo farmacêutico, o sistema de patentes tem papel relevante para se alavancar o desenvolvimento de uma solução contra o vírus, visando ao interesse social e desenvolvimento tecnológico e econômico da sociedade, sem prejuízo à proteção da saúde da população.

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Pedro Moreira

Socio, Farmaceutico, Agente da Propriedade Industrial

Socio, Farmaceutico, Agente da Propriedade Industrial

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