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Troca de arquivos: o fim do caso Grokster

por Attilio Gorini

13 de julho de 2005

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A troca de arquivos pela internet é uma prática amplamente difundida e com os mais variados objetivos como, por exemplo, a corriqueira troca de fotografias entre parentes distantes. Esse uso legítimo, no entanto, é confundido – e com nefastas implicações – com atividades criminosas. Uma recente decisão da Justiça americana tenta por um fim a tal situação.

Há alguns anos, a troca de arquivos digitais de música pela internet, por meio do serviço Napster, funcionou como um alarme para a indústria do entretenimento, que logo se armou e tomou medidas para evitar o pior. A atitude foi um tanto tardia mas, sob o ponto de vista legal, ficou claro que a disponibilização de serviço centralizado para a troca de arquivos, sem o devido controle de quem disponibiliza tal serviço, é considerado violação de direitos autorais.

Nos Estados Unidos, foram usadas duas teorias que responsabilizam o infrator indireto pela infração direta causada por terceiros. Na teoria do "contributory infringement", "A" pode ser responsável pela infração direta de "B" caso tenha ativamente induzido a infração ou, com o conhecimento da infração de "B", "A" tenha contribuído com os meios para torná-la possível. Na teoria do "vicarious liability", "A" será responsável pela infração de terceiro se supervisiona ou tem poder para supervisionar os atos de "B" e se beneficia financeiramente de suas atividades.

Como resultado, a indústria fonográfica americana obteve uma retumbante vitória contra o Napster, que voltou ao mercado posteriormente como um serviço de distribuição de arquivos de música devidamente licenciados. No entanto, essa vitória não significou muito em termos práticos, pois a tecnologia já havia se desenvolvido e alçado vôos muito mais altos.

Com a criação de um software que permite a distribuição descentralizada de arquivos digitais, sem que houvesse um claro culpado pelas infrações perpetradas, a indústria se deparou diante de um impasse: quem culpar? As redes P2P – ou "peer-to-peer" – proliferaram e o futuro da indústria do entretenimento estava em perigo novamente.

Diante do aumento de assinantes de internet de banda larga – o que passava a permitir troca de arquivos mais pesados, inclusive filmes inteiros – os estúdios de Hollywood se uniram à indústria fonográfica contra o Grokster e duas outras empresas que forneciam programas de computador P2P. A batalha, que chegou ao seu fim no dia 27 de junho de 2005, teve início no mês de outubro de 2001 com a alegação de que o Grokster permitia que usuários infringissem em massa os direitos autorais.

Em sua defesa, o Grokster alegou que o software que fornecia tinha como objetivo principal permitir a troca lícita de arquivos. O antecedente judicial utilizado pelo Grokster foi o famoso caso dos estúdios de Hollywood contra a Sony em 1984. Naquele caso, a Suprema Corte americana decidiu, em uma votação apertada, que os fabricantes de aparelhos de videocassete não poderiam ser considerados responsáveis pelas infrações de consumidores pois o aparelho tinha muitos outros usos lícitos.

No caso Grokster, em primeira instância, o juiz se recusou a aplicar as teorias do "contributory infringement" e do "vicarious liability" pois, diferentemente do caso Napster, o Grokster não poderia ter qualquer controle sobre o uso de seu programa por terceiros. Em segunda instância, no mês de agosto de 2004, o tribunal, apesar de reconhecer que a maioria do que era trocado utilizando-se o software era pirata, não havia nada que o Grokster pudesse fazer para parar o processo. Em outras palavras, não havia qualquer interferência do criador uma vez vendido ou baixado o programa de computador.

Foi, sem dúvida alguma, a festa dos que achavam que a internet é uma terra sem lei. A comemoração, no entanto, durou pouco, pois a Suprema Corte americana reverteu a tendência e determinou o Grokster responsável pela violação causada pelos usuários dos programas.

Interpretando o caso Sony restritivamente, a corte afirmou que, se for comprovado que o fornecedor da tecnologia tem como objetivo induzir as pessoas a infringir os direitos autorais, então há sim responsabilidade. Pelo que se pôde constatar no caso, por exemplo, muita da publicidade do Grokster era direcionada a ex-usuários do sistema Napster.

Essa decisão – unânime – encerra uma era mas não elimina o problema. Os usuários que já baixaram o programa certamente vão continuar fazendo uso dele mas desde já fica claro que a distribuição de tecnologia tendo com princípio facilitar a infração de direitos autorais é também infração e deve ser punida com todo o vigor.

Muitos alegam que essa decisão terá o efeito de paralisar o desenvolvimento de novas tecnologias, o chamado "chilling effect", pelo medo de novas medidas judiciais. No entanto, há também que se pesar o efeito paralisante que programas como esse causam à indústria como um todo. A tendência é que a balança pese para o lado dos criadores e titulares de direitos autorais, já que o fruto dessas obras gera uma das mais importantes fontes de receita mundiais: o entretenimento.

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Attilio Gorini

Advogado, Agente da Propriedade Industrial

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