por Attilio Gorini
07 de novembro de 2006
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Em 2003, o Projeto de Lei do Senado nº 532 começou a ser discutido. Trata-se de tentativa, por parte dos exibidores cinematográficos, de evitar o recolhimento de porcentagem do preço do ingresso de cinema, a título de direitos autorais e conexos, por execução pública de obras musicais. Esse projeto, recentemente, tomou nova força e foi objeto de diversos anúncios em revistas tentando sensibilizar a população para o problema.
O ECAD é o órgão central de arrecadação de direitos autorais e conexos pela execução pública de obras musicais e, nessa função, tem o dever de arrecadar valores, que são determinados em tabela própria, pelas obras musicais que são executadas, tanto nos intervalos das sessões de cinema, como na trilha sonora da obra cinematográfica. Da mesma forma, o ECAD cobra pela música que se ouve em canais de televisão, festas juninas, rádios, consultórios de dentistas e lojas, dentre vários outros.
Os exibidores cinematográficos, há anos, vêm lutando vigorosamente para não pagar os 2,5% sobre o preço bruto de cada ingresso de cinema, determinado pelo ECAD, e o Projeto de Lei em questão é mais um passo nesse sentido. Em síntese, os exibidores alegam que, quando os estúdios estrangeiros ou brasileiros obtêm licença para sincronizar a obra musical na obra cinematográfica, essa licença automaticamente se estende para a execução pública e, claro, para o contrato de distribuição e exibição cinematográfica. O Projeto de Lei, então, cria uma ficção jurídica, alterando a relação entre partes privadas e criando uma perigosa exceção legal.
Em primeiro lugar, a autorização para a sincronização da obra musical não significa, automaticamente, que todos os direitos de execução pública foram pagos, ao contrário. A Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98) estabelece com muita clareza que as diversas modalidades de utilização de obras são independentes entre si, e a autorização concedida pelo autor, ou pelo produtor, respectivamente, não se estende a quaisquer das demais.
Em segundo lugar, o Projeto de Lei não elimina completamente a obrigação do pagamento de direitos autorais pela execução pública de obras musicais o que, em tese, violaria tratados internacionais, mas isenta uma categoria desse pagamento. Em outras palavras, o Projeto tem o cunho de favorecer apenas um pequeno grupo de empresas, detentoras de redes de cinema. A pergunta que se deve fazer é: se o exibidor cinematográfico será beneficiado, por que não as redes de televisão também? O Projeto, como proposto, é, no mínimo, não isonômico para situações idênticas.
Em terceiro lugar, o Projeto, ao excluir os exibidores desse pagamento, não informa quem deverá, então, ser o responsável pelo pagamento dos valores devidos. Seriam os distribuidores? Os produtores? Essa questão fundamental, infelizmente, não é sequer abordada.
Finalmente, caso o Projeto de Lei venha a ser aprovado e sancionado pelo Presidente da República, os autores e titulares de direitos conexos não mais receberão renda oriunda da execução pública, em cinema, de suas obras musicais, pelo menos não sem uma definição inexistente no momento sobre quem será o responsável pelo pagamento.
O Projeto de Lei, como apresentado, privilegia apenas uma categoria de empresários em detrimento de autores e titulares de direitos conexos. Espera-se que o Congresso Nacional reflita sobre a matéria com calma, para evitar mais um grande problema em nossa legislação sobre os direitos autorais.