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O Direito Autoral e as empresas

por Attilio Gorini

01 de dezembro de 2004

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Nos últimos anos, a Justiça brasileira tem visto um aumento significativo do número de casos envolvendo cessão dos direitos autorais e conexos. Tais decisões começam, aos poucos, a revelar os desdobramentos da intrepretação da Lei de Direitos Autorais (LDA) e da Lei 6.533/78, que regula a profissão do artista e, sobretudo, deixam claro os cuidados que as empresas que contratam a prestação de serviços criativos devem ter.

Uma decisão que merece destaque se deu em ação movida pela cantora Cybele de Sá contra a Abril Video da Amazonia S.A. (ação nº 778-01, 32ª Vara Cível de São Paulo). A Autora alegou que seus direitos conexos de dubladora referentes às canções do clássico filme Branca de Neve e os Sete Anões não teriam sido cedidos e, por essa razão, a Abril não poderia distribuí-lo em home video. A Abril, porém, conseguiu comprovar que, à época dos serviços, a Autora havia cedido todos os seus direitos sobre a dublagem e, com isso, foi derrotada em primeira instância. A apelação ainda não foi julgada.

Outra decisão se refere à obra O Senhor dos Anéis. Lenita Maria Rimoli Esteves e Almiro Pisetta moveram ação contra a Livraria Martins Fontes Editora Ltda. alegando que não teriam autorizado mais que uma edição dos livros por eles traduzidos para o português (ação nº 000.02.196409-2, 37ª Vara Cível de São Paulo). Com o sucesso dos filmes, a Livraria Martins Fontes teria disponibilizado ao público diversas edições dos livros, sempre com as traduções dos Autores. Considerando que não houve qualquer contrato entre as partes, a Livraria Martins Fontes foi condenada a pagar 5% do valor de capa de cada unidade vendida além da primeira edição dos livros. A apelação ainda não foi julgada.

A LDA somente considera autor a pessoa física, ou seja, não admite que uma empresa seja a criadora de uma obra, mesmo que ela seja responsável por sua organização. A pessoa jurídica poderá ser apenas titular, exclusiva ou não, da obra criada por pessoa física, o que somente ocorrerá no caso de cessão dos direitos, já que o conceito de obra sob encomenda é inexistente na lei.

A primeira e talvez mais importante das regras determina que qualquer negócio jurídico envolvendo direitos autorais deve ser interpretado restritivamente. Em seguida, a LDA enumera requisitos para a cessão dos direitos autorais, especiamente a necessidade de instrumento escrito. O contrato deve detalhar, dentre outros, as condições e o prazo da cessão e, também, as modalidades de utilização. Sem contrato, em princípio, não há cessão e, certamente, essa foi uma das razões principais para a derrota da Martins Fontes em primeira instância.

A Lei 6.533/78 determina, em seu artigo 13, que os direitos conexos oriundos da prestação de serviços não são passíveis de cessão. No entanto, o artigo 92 da LDA, claramente afirma que os direitos autorais do artista podem ser cedidos. Há, assim, claro conflito. Cybele de Sá foi derrotada em primeira instância pois seus serviços foram prestados muito antes da lei de 1973. Talvez o resultado fosse outro se o serviço tivesse sido prestado nos dias atuais.

As questões acima, ainda sem perspectivas de resolução no horizonte, demonstram com clareza que as empresas devem estar atentas para qualquer negócio jurídico envolvendo a prestação de serviços criativos. É essencial uma redação clara, ao mesmo tempo detalhada e abrangente, de forma a evitar as várias armadilhas existentes na LDA que podem resultar em enormes desgastes e condenações em valores expressivos. 

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Attilio Gorini

Advogado, Agente da Propriedade Industrial

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