por Giselle da Silveira Mauricio
01 de dezembro de 2006
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A Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), firmada na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro, em 1992, protege os materiais genéticos e os conhecimentos tradicionais associados à diversidade biológica que são de titularidade de comunidades locais e indígenas. Ela busca estabelecer um fluxo internacional de materiais genéticos, transferência de tecnologia e repartição justa e eqüitativa de benefícios. Todavia, este fluxo deve ser regulado por leis nacionais de cada país de onde se originou o material genético.
No Brasil, a Medida Provisória nº 2.186-16, de 23 de agosto de 2001, estabeleceu, entre outros pontos, a aplicação de mecanismos de propriedade intelectual sobre produtos ou processos obtidos a partir de acesso a conhecimentos tradicionais de povos indígenas e tradicionais, exigindo em contratos de repartição de benefícios cláusulas obrigatórias dispondo sobre propriedade intelectual.
Segundo a MP nº 2.186-16/01, para garantir essa repartição de benefícios, o interessado em depositar um pedido de patente, cuja invenção envolva materiais genéticos e/ou conhecimentos tradicionais, tem que demonstrar ao órgão patentário a observância da lei, ou seja, a autorização expedida pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), sob administração do Ministério de Meio Ambiente (MMA), e informar a origem do material genético e do conhecimento tradicional acessado. No Brasil, elegeu-se o certificado de procedência legal (que inclui a declaração de origem) como mecanismo de rastreamento para repartição de benefícios. Ainda segundo a MP nº 2.186-16/01, a não indicação da origem do material genético pode acarretar o cancelamento da patente.
Recentemente, o Tribunal de Contas da União (TCU), após uma auditoria realizada, apontou que o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) não estaria cumprindo a MP nº 2.186-16/01, especificamente o artigo 31 que exige a informação da origem do material genético e do conhecimento tradicional associado (quando for o caso) no pedido de patente, impedindo assim um dos objetivos da CDB.
O INPI se manifestou argumentando que ainda não está aplicando o artigo 31 da Medida Provisória por considerá-lo um dispositivo que não tem eficácia imediata e que dependeria da regulamentação do Poder Executivo.
Já o MMA afirma que a concessão de patentes envolvendo materiais genéticos e/ou conhecimentos tradicionais passou a estar atrelada à comprovação do cumprimento dos dispositivos estabelecidos pela Medida Provisória, independentemente de regulamentação. Recentemente, o MMA emitiu um parecer confirmando este entendimento.
Por esse motivo o TCU determinou que a Advocacia Geral da União (AGU) emita um parecer sobre o entendimento da aplicação da norma, e também recomendou que o MMA e o INPI discutam as medidas necessárias para pronto cumprimento das disposições do artigo 31 da Medida Provisória. Além disso, um Grupo de Trabalho (GT) foi criado pelo CGEN para discutir as formas de implementação do artigo 31 da Medida Provisória. Contudo, até o fechamento desta edição do Informativo não havia sido divulgada uma decisão definitiva sobre o assunto.
Como pode ser visto acima, é possível que objeções sejam levantadas contra documentos de patente brasileiros que não descrevam a origem dos respectivos materiais genéticos e dos conhecimentos tradicionais associados (se houver). Porém, os mecanismos e requisitos para introdução de tal indicação da origem dos referidos materiais genéticos nos pedidos de patente no Brasil continuam indefinidos, mas espera-se o estabelecimento das normas sobre o assunto em um futuro próximo, quando então enviaremos nossas recomendações específicas.