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Extratos vegetais e a sua proteção patentária no Brasil

por Ursula Torres Trindade

01 de dezembro de 2010

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Desde os primórdios da medicina, extratos vegetais são utilizados no tratamento de diversas doenças. Os medicamentos de origem vegetal vêm se tornando cada vez mais valiosos à sociedade. Além disso, o apelo comercial desse tipo de medicamentos é particularmente relevante, já que se trata de produtos corriqueiramente associados à saúde e à ausência de efeitos colaterais.

O Artigo 10 (IX) da Lei de Propriedade Industrial nº 9.279/96 (LPI) não considera como invenção o todo, ou parte, de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados1, porque eles são considerados como meras descobertas. Ou seja, em princípio, extratos vegetais per se não seriam considerados como matéria patenteável no Brasil.

Apesar dos empecilhos legais à proteção de extratos obtidos a partir de plantas através do sistema de patentes, há outras alternativas para se obter uma proteção para esse tipo de invenção.

Por exemplo, o extrato de interesse pode ser reivindicado na forma de uma composição, farmacêutica ou cosmética, compreendendo excipientes farmacêutica ou cosmeticamente aceitáveis. Naturalmente, tal composição, sendo nova e inventiva, seria considerada patenteável pelas disposições do referido Artigo 10 (IX) da LPI. Deve-se apenas atentar para o fato de que o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), Autarquia federal competente para a concessão de patentes no Brasil, não considera o meio de extração como excipiente de uma composição. Isto é, no entendimento do INPI, a água ou o álcool, por exemplo, não seriam considerados como excipientes de uma composição farmacêutica para aferição de sua patentabilidade, mas como meros diluentes, e a composição farmacêutica seria considerada como uma mera diluição de um produto natural2. Da mesma forma, se a composição farmacêutica for caracterizada por compreender apenas o extrato vegetal, o INPI entende que a proteção não está sendo pleiteada para uma composição, mas sim para o extrato per se, não sendo, consequentemente, considerado privilegiável. Assim, ao se reivindicar uma composição farmacêutica compreendendo um extrato natural, é recomendável especificar os adjuvantes ali presentes.

Não obstante o exposto acima, o Artigo 42 da LPI garante ao titular de uma patente de processo impedir que terceiros utilizem, coloquem à venda, vendam ou importem o processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado3.

Deste modo, uma outra alternativa para proteção patentária indireta de um extrato ou ainda de uma molécula obtida a partir de uma planta, ou através de um processo sintético, seria por meio da reivindicação de um processo pelo qual foram obtidos. Naturalmente, esse processo de extração ou de isolamento deve necessariamente atender aos requisitos básicos de patenteabilidade determinados pelo Artigo 8º da LPI, isto é, deve ser novo, inventivo e apresentar aplicação industrial.

Uma terceira possibilidade de proteção pelo sistema de patentes para extratos naturais é através das reivindicações de uso terapêutico. No entanto, recomenda- se a redação dessas reivindicações no formato conhecido como "Fórmula Suíça" (uso do produto X caracterizado por ser na preparação de um medicamento para tratar a doença Y), de modo a não incidir nas proibições legais do Artigo 10 (VIII) da LPI4, que impede o patenteamento de métodos de tratamento.

Assim, mesmo diante dos empecilhos legais impostos pela LPI, há alternativas que permitem a proteção patentária indireta de produtos diretamente extraídos da natureza.

[1] Art. 10. Não se considera invenção nem modelo de utilidade: (…)
IX – o todo ou parte de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados, inclusive o genoma ou germoplasma de qualquer ser vivo natural e os processos biológicos naturais.

[2] Item 2.6, “Composições baseadas em produtos não-patenteáveis, sub-item 2.6.1, das Diretrizes de Exame de Pedidos de Patente nas Áreas de Biotecnologia e Farmacêutica Depositados após 31/12/1994.

[3] Art. 42. A patente confere ao seu titular o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos: I – produto objeto de patente;
II – processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado.
§ 1º Ao titular da patente é assegurado ainda o direito de impedir que terceiros contribuam para que outros pratiquem os atos referidos neste artigo.
§ 2º Ocorrerá violação de direito da patente de processo, a que se refere o inciso II, quando o possuidor ou proprietário não comprovar, mediante determinação judicial específica, que o seu produto foi obtido por processo de fabricação diverso daquele protegido pela patente.

[4] Art. 10. Não se considera invenção nem modelo de utilidade: (…)
VIII – técnicas e métodos operatórios ou cirúrgicos, bem como métodos terapêuticos ou de diagnóstico, para aplicação no corpo humano ou animal; (…)

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Ursula Torres Trindade

Agente da Propriedade Industrial , Farmaceutica

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