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Abandono da Propriedade Industrial

por Peter Dirk Siemsen

19 de outubro de 2001

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O Brasil sempre teve um papel de destaque internacional no âmbito da propriedade industrial. Fomos fundadores da Convenção da União de Paris (1883), da Convenção Pan-Americana de Buenos Aires (1910), da Convenção de Santiago (1923) e do Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (1970). No entanto, a aplicação do conceito de propriedade industrial no Brasil como instrumento de desenvolvimento tem sido extremamente limitada. Os motivos para isso são de natureza cultural, econômica e política. Faltava aos nossos governos e ao nosso empresariado a visão da importância do desenvolvimento da tecnologia criada no próprio país. Esses fatores levaram o Brasil a tratar a propriedade industrial com certa indiferença, interrompida, vez por outra, por alguns lampejos.

Desde a década de quarenta, se faz notar o abandono em que se encontra a área de proteção da propriedade industrial. Após alguns anos de melhora, no início da década de setenta, se iniciou um novo período de decadência, que se mantém até hoje. Foi também nas décadas de setenta e oitenta que a ação governamental prejudicou o acesso à tecnologia estrangeira, sobretudo à tecnologia de informática. Os grandes prejudicados por essa política cega e retrógrada foram as empresas privadas, já que as estatais eram sempre privilegiadas. O final da década de oitenta trouxe alguns estímulos, como o reconhecimento do sistema de franquias e a melhora das decisões judiciais no combate à pirataria.

Em 1991, o governo enviou ao Congresso Nacional um péssimo projeto de lei de propriedade industrial. Durante cinco anos, a ABPI – Associação Brasileira da Propriedade Intelectual, especialistas e alguns representantes empresariais negociaram intensamente a reforma desse projeto com os representantes do Congresso. Após muito trabalho e discussão, o Congresso aprovou uma das mais modernas e avançadas leis de propriedade industrial – a Lei 9.279/96, de 14/05/96.

Esta lei se tornou um dos fatores de confiança, tendo colaborado para os grandes investimentos estrangeiros que aqui aportaram de 1996 a 2000. Por outro lado, faltava reformular o órgão responsável pela concessão dos direitos de propriedade industrial – o INPI. Minado pela burocracia e abandonado pelo governo federal, representava um entrave cada vez maior ao desenvolvimento comercial e industrial do País. Nem sempre a culpa era dos dirigentes, mas, sobretudo, de uma política governamental incompetente e burocrática. Não era permitido ao INPI contratar pessoal tecnicamente preparado e em quantidade para atender à crescente demanda por seus serviços.

Hoje, o INPI recebe três vezes mais pedidos do que há 10 anos, mas tem menos da metade dos funcionários daquela época. Como conseqüência, encontramos um atraso no exame de pedidos de registro de marca e pedidos de patente. Recentemente, um episódio demonstrou como o problema é tratado em Brasília. Depois de muita demanda, foi autorizado um concurso para contratar provisoriamente (por um ano) um determinado número de técnicos para a área de patentes. Como um técnico de patentes leva de três a cinco anos para se tornar um funcionário qualificado para o exame efetivo de um pedido de patente, essa contratação se torna praticamente inútil.

A propriedade industrial no Brasil está em situação equivalente à da energia. Paradoxalmente, é melhor que o Brasil não cresça para que os problemas não se tornem insolúveis. No entanto, se quisermos conquistar novos mercados e manter os conquistados, teremos que agregar tecnologia aos produtos e investir nas marcas.

A indústria nacional, tão espoliada pelos governos no decorrer das últimas quatro décadas, descapitalizada pela inflação, oprimida pela tributação, comprimida pelos congelamentos de preços e estagnada por juros elevados, necessita de amplo apoio para deixar o mundo de ontem e ingressar na produção de tecnologias que a coloque em pé de igualdade com suas concorrentes de outros países. No entanto, para atingir esse objetivo é necessário contar com um órgão eficiente na área de patentes, além de uma boa legislação. 

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Peter Dirk Siemsen

Agente da Propriedade Industrial , Advogado

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