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Brasil, Mostra a tua Marca

por Sandra Leis

30 de dezembro de 2003

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Para muita gente, marca é só aquela etiqueta pendurada na gola das roupas, aquele rótulo em volta das latas ou aquele adesivo grudado nos plásticos, que quase sempre teima em não sair. Com exceção daqueles profissionais que lidam com esses sinais no seu dia-a-dia, poucas pessoas percebem a amplitude, magnetismo e importância desse tema.

Na lista das 100 marcas mais valiosas e igualmente famosas publicada este ano pela Interbrand, conhecida empresa de consultoria, aparecem, invariavelmente, Coca-Cola, Microsoft, McDonalds, IBM e outras norte-americanas, acompanhadas por japonesas como Sony e Toyota e alemãs como Mercedes e BMW. Porém, constatamos, desapontados, que nessa lista não figura nenhuma marca brasileira.

Temos marcas sólidas e quase centenárias, como Catupiry, Leite de Rosas, e Phebo, que sobreviveram a guerras, crises e reviravoltas políticas, até as mais jovens como Natura e O Boticário. Todas genuinamente e orgulhosamente nacionais. No entanto, poucas são as marcas brasileiras que chegaram a um grau de renome tal que possam ser consideradas famosas. Falta de originalidade? Pouco provável. Falta de publicidade adequada? Pode ser. Certo mesmo é a falta de confiança por parte do empresário nacional em fazer valer a sua capacidade criativa dentro e fora do Brasil e a falta de percepção de que a proteção da marca, através do seu registro, é tão importante quanto toda a publicidade e estratégia para o lançamento de um novo produto no mercado. A tudo isso, soma-se a extrema burocracia que emperra a exportação dos nossos produtos, o excesso de impostos que torna a maioria dos empreendimentos inviáveis, sobretudo os de pequeno porte, e os altos custos de proteção das marcas no exterior. Ademais, além de futebol e belas mulheres, o Brasil exporta, principalmente, produtos do agronegócio (cerca de 40% do total), que são, em geral, produtos sem marca – os chamados non-branded goods.

De 1996 a 2001, o número de marcas brasileiras depositadas junto ao órgão registrador da Comunidade Européia não passou de 505 e, em 2002, foi de somente 126. Uma lástima. Na contramão desses números, o INPI recebe uma enorme quantidade de pedidos de registro de marca de empresas estrangeiras. Esse desequilíbrio sempre existiu, desde o final do século 19, quando o Brasil ainda fazia parte do Acordo de Madri.

Apesar da demora de, no mínimo, 3 anos para se obter o registro de uma marca no Brasil, empresas estrangeiras continuam a buscar proteção para suas marcas aqui e, surpreendentemente, nosso país continua a ocupar o oitavo lugar no ranking dos países captadores de investimentos estrangeiros. No entanto, é preciso muita perseverança. Um dia desses, um advogado irlandês, ansioso para obter o registro da marca do seu cliente no Brasil, colocou, indignado, a seguinte questão: "Na próxima vez em que um cliente me pedir para depositar uma marca no Brasil, eu terei que perguntá-lo se realmente precisa ter sua marca protegida no Brasil, devido à demora desordenada que ele terá que experimentar. Eu considero que essa situação não será benéfica para ninguém, particularmente para o Brasil". Aquele advogado nem imaginava que existem hoje, no INPI, cerca de 250 mil pedidos de registro de marca aguardando exame, que os funcionários daquela autarquia não dispõem de condições mínimas de trabalho, que a receita daquele órgão é desviada para outros fins, que a Revista da Propriedade Industrial é veiculada com atraso por falta de pagamento à gráfica, enfim, todas as tragédias que abatem o nosso combalido e desvalorizado INPI. Se soubesse, talvez tivesse desistido do registro da marca.

Mas nem tudo é tristeza. A presença de nossos produtos lá fora vem crescendo a cada dia e, na maioria dos casos, com bastante sucesso. Biquínis "made in Brazil" da marca Salinas já se encontram nas melhores vitrines dos Estados Unidos e Europa e a cachaça de Salinas (MG) já faz seus primeiros ensaios exportadores para a Itália. Nossas Havaianas já calçam os pés dos europeus, que não se importam em pagar pelas "legítimas" preços que variam entre 50 e 500 reais. A Embraer já voa alto, alcançando a posição de quarta maior fabricante de aviões comerciais do mundo, e a Brahma, não satisfeita em se fazer presente em vários países da América do Sul, Europa e Japão, conseguiu invadir os bares guatemaltecos, quebrando o monopólio da cervejaria local. A Sadia está nas mesas de cerca de 60 países e, no Oriente Médio, já é sinônimo de frango, ainda que para isso a empresa tenha que seguir rígidas regras islâmicas, abatendo os frangos com o peito voltado para a cidade de Meca, sob o olhar atento de supervisores árabes.

Nossas marcas têm um longo caminho a percorrer. É preciso que o governo continue trabalhando em várias frentes, através do SEBRAE e outros órgãos de apoio às empresas, principalmente as de índole exportadora, para que o empresário brasileiro readquira a confiança perdida e se conscientize da importância de proteger sua marca, aqui e lá fora.

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Sandra Leis

Advogada, Agente da Propriedade Industrial

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