por Monique Rodrigues Teixeira
27 de dezembro de 2012
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Originários de uma natureza química de elevada complexidade (instáveis, com estrutura tridimensional, alto peso molecular e de natureza biológica heterogênea, dentre outras características) e sintetizados a partir de organismos vivos, os medicamentos biológicos vêm se destacando como uma das principais fontes, senão a mais importante, de inovação no campo farmacêutico, e atualmente representam uma parcela particularmente relevante dos medicamentos disponíveis no mercado.
As pesquisas nesse campo da tecnologia resultaram em uma revolução na terapêutica de diversas patologias, permitindo o desenvolvimento de opções no tratamento de inúmeras enfermidades complexas, crônicas e até mesmo pouco frequentes, cujas terapias não eram disponíveis ou sequer eficazes para todo tipo de paciente. É esse o motivo pelo qual a indústria biotecnológica se transformou na principal fonte geradora de novos medicamentos, e também de grande importância no prisma social e econômico, devido à necessidade de mão-de-obra qualificada detentora do conhecimento técnico específico, o que, consequentemente, fomenta as pesquisas e gera empregos.
Naturalmente, um dos alvos da indústria de genéricos é também aplicar a esses medicamentos biológicos os mesmos princípios aplicáveis aos usuais. Contudo, a reprodução de medicamentos biológicos – como comumente ocorre entre os medicamentos químicos usuais – não é factível, ao menos no momento, em face de sua elevada complexidade, seu laborioso processo de fabricação, entre outros aspectos. Por outro lado, é possível a obtenção de similares de medicamentos biológicos novos, que são usualmente designados biossimilares.
O medicamento biossimilar1 é uma versão secundária (não nova) e subsequente de um medicamento biológico de referência, cuja autorização para comercialização pela Autoridade Regulatória já fora previamente obtida.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), em conjunto com outras agências de regulação internacionais, tem desempenhado a sua função visando à criação e instituição de padrões e mecanismos científicos que garantam a segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos biológicos que são produzidos em nível mundial. Ademais, há também a preocupação quanto à regulamentação no sentido de estabelecer que medicamentos de natureza biológica não possam ser “copiados”.
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) regulamenta o registro de produtos genéricos desde 2003 (Resolução RDC 135, de Maio de 2003) e estabelece que os produtos biológicos derivados do plasma ou sangue humanos, e os produtos biotecnológicos, com exceção dos antibióticos e fungicidas, não são admitidos para fim de registro genérico(2).
A ANVISA também possui um arcabouço normativo para registro de produtos biológicos, inicialmente estabelecido pela RDC nº 80/2002, e atualmente regido pela RDC nº 55/2010, que estabelece requisitos mínimos de qualidade, segurança e eficácia para estes medicamentos.
Em termos conceituais, a Agência Européia de Medicamentos (European Medicine Agency – EMA) e a ANVISA adotam sistemas similares, diferenciando-se apenas quanto à nomenclatura. A ANVISA trabalha com as definições de “produtos biológicos novos” (medicamentos biológicos com molécula de atividade biológica conhecida, ainda não registrada no Brasil) e de “produtos biológicos” (definição idêntica à do “medicamento biológico novo”, porém esse se refere à molécula de referência já registrada no Brasil). Os produtos biolo´gicos novos devem ser registrados pela via regulato´ria cla´ssica, com apresentaça~o de dossiê completo contendo todos os dados de produça~o, controle de qualidade e dados na~o cli´nicos e cli´nicos (Fase I, II e III) completos. Ja´ para os produtos biolo´gicos (não inovadores), há duas vias regulatórias possíveis para registro: a de desenvolvimento por comparabilidade, e a de desenvolvimento individual. Nessas duas vias, é possível apresentar um dossiê de registro com informações reduzidas, sendo alguns testes clínicos exigidos.
A Lei nº. 10.603 restringe a proteção de informação não divulgada submetida para aprovação da comercialização a produtos de uso veteri-nário, fertilizantes, agrotóxicos, seus componentes e afins. No entanto, há a possibilidade de se discutir ou reivindicar a mesma proteção para produtos farmacêuticos por meio de interposição de ação judicial, por analogia ao disposto na referida Lei.
No que diz respeito à proteção patentária, medicamentos são passíveis de patenteamento segundo a Lei da Propriedade Industrial (LPI) Nº 9.279/1996. Não há qualquer restrição na LPI no que tange à proteção de medicamentos biológicos. Desse modo, desde que atendidos os requisitos de patenteabilidade de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial, elencados nos Artigos 8, 11, 13 e 15 da LPI, esses medicamentos, assim como seus processos de obtenção/melhoramento, bem como kits e composições/combinações farmacêuticas que os compreendenda, são também plenamente passíveis de proteção patentária no Brasil.
1 Também conhecido na Europa como “biofármaco não-inovador”, e nos E.U.A. como “Follow-On Protein Product” ou “Follow-on Biologic”, no Canadá como “Subsequent-Entry Biologics” e pela OMS como “Similar Biotherapeutic Product”.
2 (…) IV – Medicamentos que não serão aceitos como genéricos
Não serão admitidos, para fim de registro de medicamento genérico: (…)
3. produtos biológicos, imunoterápicos, derivados do plasma e sangue humano;
4. produtos obtidos por biotecnologia, excetuando-se os antibióticos, fungicidas e outros, a critério da Anvisa; (…)”