por Marcelo Mazzola
23 de agosto de 2018
compartilhe
O CPC promoveu relevantes alterações no campo das provas e dos recursos, com a finalidade de otimizar a prestação jurisdicional.
Neste breve artigo, a ideia é sustentar a possibilidade de realização de prova técnica simplificada no agravo de instrumento envolvendo tutela provisória1, com foco na área da propriedade intelectual2.
Nesse ramo do Direito, em que a concorrência mercadológica é acirrada, os pedidos de tutela provisória são recorrentes. E a questão sempre é delicada, pois, de um lado, a concessão de uma liminar pode, na prática, criar efeitos irreversíveis — é o que ocorre, por exemplo, quando se determina a retirada de um produto do mercado, impede alguém de usar uma marca ou explorar determinada invenção, ou, ainda, a fazer alterações nas embalagens — e, por outro, a não concessão da medida pode criar prejuízos imensuráveis ao titular do direito, desde a diluição de seu signo distintivo até a perda considerável de fatia de sua clientela.
Daí porque a análise dos pedidos de tutela em ações dessa natureza deve ser feita de forma bastante cuidadosa e criteriosa, à luz do acervo fático-probatório e dos elementos técnicos existentes.
Como as respectivas decisões interlocutórias são invariavelmente desafiadas por agravo de instrumento e diante da tecnicidade do assunto, entendemos que a prova técnica simplificada pode ser uma importante ferramenta para a formação do convencimento do julgador.
Inicialmente, vale destacar que a prova técnica simplificada não tinha previsão expressa no CPC/1973. No CPC/2015, está regulada no artigo 464, parágrafos 2º, 3º e 4º3.
Como os próprios dispositivos legais estabelecem, tal prova pode ser deferida de ofício ou a requerimento das partes, quando o ponto controvertido que demande especial conhecimento técnico ou científico for de menor de complexidade4.
Em linhas gerais, trata-se de modalidade de prova pericial, com a peculiaridade de consistir em depoimento oral do especialista — que deve ter formação acadêmica específica na área — sobre ponto controvertido5. Durante sua atuação, o profissional pode se valer de todos os meios técnicos necessários para influenciar a construção do pronunciamento judicial, devendo ser facultada às partes, através de seus assistentes técnicos6, requerer esclarecimentos adicionais.
Em razão de seu espectro limitado, a prova técnica simplificada é vista como alternativa mais célere e menos custosa para esclarecer questões que exijam conhecimento especializado7.
Via de regra, essa modalidade de prova está conectada à fase instrutória, podendo ocorrer, ainda, durante a audiência de instrução e julgamento8.
Nesse ponto, consideramos que a prova técnica simplificada também pode ser realizada em sede de agravo de instrumento, apesar da ausência de previsão legal expressa.
Primeiro, porque o tribunal também tem poderes instrutórios (artigos 370 e 932, I, do CPC/2015)9, podendo determinar a realização de provas10. Segundo, porque o julgador pode alterar a ordem de produção dos meios de prova (artigo 139, VI, do CPC/2015), diante das necessidades do conflito e para conferir maior efetividade à tutela do direito. Terceiro, porque é dever do julgador extrair o máximo de rendimento da atividade jurisdicional11, à luz dos princípios da cooperação e da eficiência processual (artigos 6º e 8º do CPC/2015).
O exemplo a seguir ajudará a compreender a aplicabilidade prática dessa prova. Imaginemos que, em uma ação de infração de patentes, por exemplo, o juiz, escorado em pareceres técnicos acostados à petição inicial, defira uma tutela provisória determinando que o réu se abstenha de utilizar a invenção do autor, sob pena de multa diária. Inconformado, o réu recorre e também acosta pareceres elaborados por instituições técnicas, alegando que uma das reivindicações da patente do autor não tem o alcance apontado, o que, por si só, desnaturaria a alegada infração. Nesse caso, diante da controvérsia quanto ao alcance da proteção patentária, exsurge a necessidade de se interpretar corretamente a referida reivindicação.
Ocorre que o julgador, a rigor, não detém conhecimento técnico especializado para uma análise — ainda que pontual — dessa natureza.
A bem da verdade, seria muito mais fácil para o tribunal dar provimento ao agravo de instrumento do réu e revogar a liminar deferida, alegando a necessidade de maior dilação probatória.
Porém, pensamos que “essa saída”, além de materializar negativa de prestação jurisdicional, não é consentânea com as normas estruturantes do processo civil contemporâneo. Se existem meios e ferramentas para que a tutela seja prestada, sem atropelos e violação ao devido processo legal, este deve ser o encaminhamento. Um julgador colaborativo e eficiente deve, sempre que possível, assegurar uma decisão justa, em tempo razoável.
Por fim, vale esclarecer que a produção da prova técnica simplificada na seara recursal, ainda que respeitado o contraditório-participativo, não substitui a prova pericial a ser realizada na fase instrutória da demanda12, pois, como dito, só tem cabimento quando houver necessidade de esclarecimento especializado sobre ponto técnico de menor complexidade.