por Carlos Eduardo Eliziario de Lima
01 de julho de 2009
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Por força da Lei da Propriedade Industrial (Lei Nº 9279/1996) e da legislação fiscal (Lei Nº 4131/62, Lei Nº 4506/64, entre outras), contratos de cessão/licença de direitos de propriedade industrial e quaisquer outros acordos que impliquem fornecimento de tecnologia devem ser averbados pelo INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) para as seguintes finalidades: (i) oponibilidade perante terceiros; (ii) remissibilidade de pagamentos ao exterior; e (iii) dedutibilidade fiscal de tais pagamentos.
Ocorre que, embora a necessidade de averbação para tais finalidades seja, de certo modo, pacífica, não há consenso a respeito dos limites da atuação do INPI no processo de averbação de contratos envolvendo transferência de tecnologia.
Atualmente, para que um contrato seja averbado pelo INPI, as partes devem, ao estabelecerem os termos e condições do acordo, observar todas as regras aplicáveis pelo Instituto. Muitas vezes, para atender determinada solicitação da referida autarquia, as partes são compelidas a firmar aditivo contratual modificando condições previamente ajustadas, sob pena de terem o pedido de averbação negado.
Não obstante, tendo em vista que grande parcela das regras atualmente aplicadas pelo INPI não possui amparo legal, pelo contrário, deriva do Ato Normativo Nº 15/75 atualmente revogado, os limites da atuação do INPI passaram a ser discutidos no judiciário.
Essa discussão é, em grande parte, devida à alteração do artigo 2º da lei de criação do INPI (Lei Nº 5648/1970), que define as finalidades do Instituto. A partir da edição da Lei da Propriedade Industrial, excluiu-se de tal dispositivo o seu parágrafo único, que estabelecia o seguinte: "Sem prejuízo de outras atribuições que lhe forem cometidas, o Instituto adotará, com vistas ao desenvolvimento econômico do País, medidas capazes de acelerar e regular a transferência de tecnologia e de estabelecer melhores condições de negociação e utilização de patentes".
Diante de tal exclusão, grande parte da doutrina passou a entender que a atividade do Instituto passaria a ser meramente registral.
As primeiras decisões judiciais foram emitidas antes mesmo da alteração do artigo 2º da lei de criação do INPI e, diante da legitimidade do Instituto para "acelerar e regular a transferência de tecnologia" e "estabelecer melhores condições para negociação e utilização de patentes", foram favoráveis à intervenção.
Após a alteração do artigo 2º da lei de criação do INPI, poucas medidas judiciais questionando a intervenção do Instituto foram intentadas. As primeiras decisões do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região sustentaram a legitimidade do INPI para intervir nos contratos. Não obstante, o artigo 2º da lei de criação do INPI tenha sido alterado, entendeu-se que a intervenção teria legitimidade pela finalidade maior do órgão, que seria executar as normas de propriedade industrial, tendo em vista seus fins sociais e econômicos, podendo, inclusive, imiscuir-se na definição do preço, a fim de reprimir cláusulas/condições abusivas.
A título exemplificativo, merece destaque a decisão emitida no julgamento da Apelação em Mandado de Segurança Nº 2006.51.01.504157-8, interposta por Koninklijke Philips Electronics NV. Entendeu-se, no âmbito da referida decisão, ser legítimo o ato do INPI, que, durante o processo de averbação, limitou o preço avençado no contrato a 5% (cinco por cento) do valor da receita líquida de venda dos produtos contratuais. Inicialmente, as partes haviam definido um preço fixo por unidade vendida, que, na época do julgamento da lide, correspondia a 20% (vinte por cento) da receita líquida de venda.
Entretanto, quando a jurisprudência do TRF da 2ª Região parecia inclinar-se para legitimar a intervenção do INPI nos contratos, uma recente decisão do mesmo Tribunal foi emitida em sentido oposto.
Durante o processo de averbação de outro contrato firmado pela empresa Koninklijke Philips Electronics NV, o INPI novamente interveio nas condições de pagamento negociadas e limitou o pagamento a 5% (cinco por cento) da receita líquida de venda dos produtos contratuais.
Diante de tal intervenção, a Koninklijke Philips Electronics NV impetrou mandado de segurança, não obtendo, em primeira instância, o provimento judicial pleiteado.
Após esse revés, a empresa interpôs recurso de apelação (Apelação em Mandado de Segurança Nº 2007.51.01.800906-6), cuja relatoria foi do Desembargador Federal Messod Azulay Neto. Segundo o iminente Relator, o INPI carece de legitimidade para intervir nos contratos que lhes são submetidos à averbação por duas principais razões: (i) o Instituto não possui status de autarquia especial, sendo, pois, subordinado ao Chefe do Poder Executivo e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, característica que fulmina a independência necessária para que possa intervir nos contratos; e (ii) é inexistente qualquer previsão legal que imponha limitação na negociação do preço em um contrato de licença de exploração de patentes firmado entre partes totalmente independentes.
Esse cenário indica que a questão somente ganhará contornos mais definitivos a partir das primeiras manifestações do Superior Tribunal de Justiça a respeito.
De qualquer forma, parece-nos que o INPI carece de legitimidade para se imiscuir, por meio de determinadas restrições e exigências, em termos e condições que possam ser negociados com base na livre iniciativa e no princípio da autonomia privada.
Se houver interesse, estamos à disposição para avaliar o caso específico de sua empresa a fim de, eventualmente, adotar as medidas judiciais cabíveis para preservar os termos e condições originalmente negociados.