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O Sistema de Patentes como Ferramenta de Competitividade

por Raul Hey

19 de maio de 1999

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Introdução e Noções Preliminares

Patente: é o nome da proteção jurídica dada pelo Estado às criações intelectuais denominadas de invenções ou modelos de utilidade e se concretiza por um direito de exclusividade dado ao titular da patente, ou seja, o direito de excluir terceiros de praticarem a invenção ou modelo de utilidade protegido pela patente.

Invenção: é a criação intelectual destinada a solucionar um problema de caráter técnico ou industrial.

Invenção patenteável: é aquela invenção que atende aos requisitos que a Lei de Propriedade Industrial estabelece para a concessão de patente – novidade; atividade inventiva e aplicabilidade industrial.

Novidade – este requisito legal de patenteabilidade é comum a todos os países que possuem um sistema de patentes digno do nome, embora sua definição possa variar de país para país. O Brasil adota o que se denomina de novidade absoluta, ou seja, uma invenção é considerada nova se nunca tiver sido tornada acessível ao público antes da data de depósito no Brasil (ou antes da data de prioridade reivindicada, se for o caso) por qualquer meio e em qualquer lugar.

Atividade inventiva – este requisito, também comum na maioria das legislações de outros países, significa que, para ser patenteável, além de ser nova, a invenção não pode ser uma decorrência óbvia do estado da técnica para uma pessoa versada naquele campo da técnica considerado.

Aplicação industrial – novamente, trata-se de uma exigência que consta na grande maioria das legislações de outros países, embora sofrendo variações em sua definição, de país para país. Embora a definição de aplicação industrial constante da lei estabeleça que a invenção deva ser utilizada ou produzida em qualquer tipo de indústria, hoje em dia, com o advento cada vez mais freqüente de invenções nas áreas de informática, agricultura e serviços, entende-se que o requisito de aplicação industrial exige apenas que a invenção deva possuir utilidade, aproximando-se a definição cada vez mais daquela utilizada pela lei norte-americana.

Sistema de Patentes: é o conjunto de recursos disponíveis à sociedade para a proteção de invenções, pesquisa de tecnologia patenteada e salvaguarda de direitos de terceiros em face dos direitos de patente de outros. O Sistema de Patentes compreende, basicamente, a concessão de patentes e modelos de utilidade; as ferramentas de busca para determinação de estado da técnica e verificação da possibilidade de infração pela fabricação de novos produtos; pesquisa de tecnologia patenteada e de domínio público como forma de queimar etapas no desenvolvimento de novos produtos e tecnologias; e as diversas formas de transferência de tecnologia (como o licenciamento), como forma de aumentar os ganhos com a exploração da patente.

Como ganhar dinheiro com o Sistema de Patentes

O primeiro passo é não perder dinheiro com a utilização incorreta do sistema!

A maioria das empresas nacionais de médio e pequeno porte, e até mesmo algumas de grande porte, utiliza muito pouco ou utiliza mal o Sistema de Patentes e, com isso, deixa de ganhar muito dinheiro e, caso mais grave, perde dinheiro. Mas como isto acontece na prática ?

O maior capital de qualquer empresa seja de que área de atividade for, seja de que tamanho for, é o capital intelectual ou, dito de outra forma, é a inteligência da empresa.

Idéias são patrimônio de alto valor, que não ocupam espaço e têm um rendimento excepcional se exploradas de forma inteligente. Não há quem duvide, por exemplo, de que a Coca-Cola Company não seria o gigante que é, se não fosse a famosa "fórmula secreta" de seu principal produto. Ou que a Xerox Corporation nada seria sem a idéia de seu fundador de criar uma copiadora rápida com recursos eletrostáticos, óticos e térmicos. Ou que a Microsoft não seria o que é sem a visão de Bill Gates sobre como o mundo devia se relacionar com os computadores.

A "fórmula secreta" da Coca-Cola, o princípio das copiadoras Xerox ou a nova concepção de Bill Gates nada mais são que produtos puros do intelecto humano, popularmente conhecidos como idéias.

Como é fácil de constatar pelos exemplos acima, são as idéias que produzem lucros.

No entanto, o que aconteceria se as idéias do Bill Gates pudessem ser livremente copiadas por seus concorrentes ? Será que elas continuariam a ter o mesmo valor ? Claro que não, porque então todos fariam a mesma coisa e a Microsoft não teria a vantagem competitiva sobre os concorrentes. Chegamos, então, finalmente, ao tema central deste painel – PATENTES ASSEGURAM VANTAGEM SOBRE A CONCORRÊNCIA.

Cuidados com o uso incompleto do Sistema de Patentes

Resumindo o que foi explicado acima, têm-se que:

  • Idéias têm valor
  • Invenções são idéias de caráter técnico ou industrial
  • Mas só se puderem ser exploradas com exclusividade
  • O que garante esta exclusividade é a patente
  • Mas a patente só é concedida para invenções novas, inventivas e que tenham aplicação industrial
  • E estas condições somente são verificáveis através do uso correto do Sistema de Patentes.

Então basta patentear as novas idéias e lançar os produtos resultantes daquelas idéias no mercado para conseguir vantagens sobre meus concorrentes e aumentar minha fatia de mercado ?

Ainda não. E se alguma outra pessoa já teve a mesma idéia anteriormente e a idéia já é de domínio público ? Ou então, pior ainda, se outra pessoa teve a mesma idéia e obteve patente no Brasil, caso este em que a fabricação, uso, venda, manutenção em estoque ou importação do produto constituiriam infração da patente ?

Em outras palavras, não basta preocupar-se em obter patente para suas idéias, mas antes disso, preocupar-se em não infringir patentes de terceiros.

E a maneira de se conseguir esta certeza é a busca feita no Banco de Patentes do INPI, que contém documentação de patentes do mundo todo bem como, obviamente, todos os pedidos de patente depositados no Brasil, em vigor ou já expirados.

Conscientização e crediblidade

Gostaria aqui de abrir um parênteses para falar da credibilidade do sistema de patentes entre os empresários em nosso país e, para isto, vou pedir permissão aos senhores para citar o exemplo dos Estados Unidos da América, pelo simples fato de ser aquele o país com o qual o Brasil mantém o maior volume de negócios envolvendo transferência de tecnologia.

A constituição norte-americana que completou 200 anos de idade em 1987, estabelece em seu artigo 8º o direito dos inventores de obter proteção para suas invenções. Mais relevante se torna este dispositivo quando nos lembramos que ele consta do texto original da constituição americana que só possuia oito artigos. A fortíssima economia americana foi construída em cima de pequenos empreendedores, que se formaram sobre idéias originais que, por sua vez, encontraram proteção segura no texto constitucional que gerou a lei de patentes daquele país.

O mesmo pode-se dizer do Japão, país de dimensões territoriais reduzidas e com pouquíssimos recursos naturais, mas que conseguiu construir uma economia fortíssima totalmente fundada naquele produto de grande valor e que não precisa de espaço físico – a inteligência. O Japão é hoje o campeão mundial disparado de depósitos de pedidos de patente. E, por favor, não se deixem enganar pelo conceito ultrapassado e equivocado de que o Japão é o "país da cópia". Nada mais errado, basta ver o número de patentes concedidas em todo o mundo para depositantes japoneses, o que prova a novidade das invenções vindas daquele pequeno gigante.

Mas, e o Brasil ?

O Brasil, quando comparado com os países do chamado primeiro mundo, ainda engatinha na área de patentes, apesar de ter longa tradição na área, tendo sido um dos estados fundadores da Convenção da União de Paris (CUP), que é o principal tratado internacional de propriedade industrial e de já conceder patentes na época do Império.

Existem basicamente três razões para este estado de coisas, a saber:

  • As inúmeras e sucessivas crises econômicas que formam nossa história e que geraram em nossos empresários uma cultura de lucro em curto prazo. Aqui se encontra o primeiro ponto de conflito com o uso do sistema de patentes, que demanda um tempo razoável e a implantação de uma cultura de propriedade industrial dentro da empresa, para que dele se extraia todos os benefícios.
  • A segunda razão é a falta de conhecimento do sistema, o que gerou, ao longo dos anos, o seu uso incompleto e, portanto, errado. Esta utilização errada do sistema de patentes produziu, obviamente, resultados aqüém do esperado fazendo surgir o temido "rótulo" de que "no Brasil patentes não funcionam".
  • O terceiro motivo para a apatia do Brasil na área de patentes é o fato de que o Brasil é, tradicionalmente, um país importador de tecnologia, por um lado e, por outro a qualidade do ensino no país é sabidamente baixa, o que faz com que a maioria dos empresários não busque desenvolver novas tecnologias próprias dentro de suas empresas, na maioria dos casos porque não acreditam que isto seja possível ou então porque não conseguem enxergar as vantagens deste tipo de investimento que é protegido e garantido pelo sistema de patentes.

Ocorre, entretanto, que os tempos são outros. A globalização não só da economia, mas também a tendência marcante da uniformização das legislações dos países, inclusive na área de propriedade intelectual, consubstanciada pelo tratado GATT/TRIPS administrado pela Organização Mundial do Comércio, obriga a mudança de mentalidade sob pena de afastamento impiedoso da arena do comércio internacional.


Formas de exploração de uma patente

As patentes podem ser exploradas apenas por seu titular ou pessoas por ele autorizadas.

A decisão quanto ao uso mais rentável de uma patente decorre de uma série de fatores e alguns exemplos mais comuns são:

Exploração direta pelo próprio titular – quando a invenção protegida pela patente situa-se do ramo de atividade principal ou atividade fim do titular. O caso típico é a invenção gerada dentro do ambiente de uma empresa ou fábrica e voltada para resolver algum problema técnico ou resultado de uma pesquisa de novos produtos.

Licenciamento – quando o titular autoriza terceiros a explorarem sua patente, recebendo pagamentos (royalties) normalmente baseados no preço de venda líquido praticado pelo(s) licenciado(s). O titular pode decidir licenciar sua patente por várias razões, dentre as quais as mais comuns são:

  • Quando não tem capacidade de, sozinho, suprir o mercado. Neste caso, o licenciamento pode ser uma alternativa atraente, já que não exige o aumento de capacidade produtiva com todos os investimentos que isto acarreta e, ao mesmo tempo mantém a fatia de mercado e a vantagem competitiva sobre a concorrência.
  • Quando deseja aumentar seu território de influência, sem ter que implantar subsidiárias ou filiais.
  • Quando deseja se lançar em mercados de outros países através de licenciados locais.
  • Quando a invenção não se situa no âmbito de sua atividade principal ou atividade fim. Esta é uma situação normalmente interessante para uma empresa e decorre, via de regra, de desenvolvimento de novos produtos e tecnologias que, para serem atingidos acabam gerando invenções paralelas ou secundárias que têm valor para empresas de outras áreas (não concorrentes). Tais invenções paralelas ou secundárias formam um benvindo acréscimo de "estoque intelectual" para a empresa e constituem poderosa moeda de transferência de tecnologia, originando novos negócios com parceiros de áreas complementares e não concorrentes, com benefícios mútuos.

Como aporte de capital na formação de joint ventures ou empreendimentos similares.

Outras formas de exploração da patente existem, dependendo apenas da criatividade do titular e de fatores de momento.

Como criar uma cultura de patentes dentro da empresa e dela extrair vantagens

Em primeiro lugar, é preciso se conscientizar de que um espaço deve ser criado no fluxograma de funcionamento da empresa, para a obtenção, manutenção e exploração de patentes. Nas empresas que possuem esta cultura, o assunto patentes é tratado em nível de presidência da empresa, pelo simples fato de que trata-se, podem acreditar, da administração do bem mais valioso da empresa.

Em segundo lugar, este assunto é de grande complexidade e deve ser tratado por pessoas habilitadas para tanto. A empresa deve buscar o concurso de um especialista na matéria, ou seja, um Agente da Propriedade Industrial devidamente habilitado e de comprovada experiência na área em questão. A Associação Brasileira dos Agentes da Propriedade Industrial – ABAPI possui em seu site na Internet uma relação de seus associados com endereços e dados completos. Para os interessados, o endereço é:

https://www.abapi.com.br

Outro ponto que deve ser levado em conta para a crição de uma cultura de patentes em uma empresa, é a criação de planos de incentivo ou premiação para empregados que tenham idéias passíveis de utilização pela empresa.

A divulgação de resultados positivos obtidos pela empresa como decorrência do uso do sistema de patentes é ferramenta importante de incentivo e combustível para o surgimento de novas idéias.

Muitas outras medidas existem que contribuem para criar na empresa um ambiente propício ao uso apropriado do sistema de patentes, mas o importante é ter sempre em mente que é fundamental o envolvimento pessoal e direto da alta direção da empresa.

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Raul Hey

Advogado, Agente da Propriedade Industrial

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