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A boa-fé objetiva sob o novo Código Civil

por Marcelo Mazzola

01 de abril de 2004

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O novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002) trouxe profundas alterações no campo do direito contratual. Deixando de lado a preocupação com o apego excessivo aos conceitos e definições, o novo sistema jurídico de Direito Privado optou pela utilização de cláusulas gerais, isto é, normas genéricas que deverão nortear o juiz em seu trabalho de estudo e interpretação do caso concreto. O comportamento dos contratantes será examinado caso a caso, de acordo com os elementos e provas existentes na questão posta em exame.

É o que se depreende da leitura do artigo 422 do novo Código Civil, inspirado no artigo 1337 do Código Italiano, que traduz o princípio da boa fé objetiva: "os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa fé."

Diferentemente do Código Civil de 1916, que contemplava a boa fé subjetiva, o Código atual consagra o princípio da boa fé objetiva, que passa a ser sinônimo de fiel cumprimento do contrato. Agora, não basta existir a íntima convicção do contratante de que está pactuando um negócio legítimo, sem intenção de lesar a outra parte (boa fé subjetiva). Exige-se a boa-fé como comportamento, como conduta, que consiste em cumprir rigorosamente as condições estabelecidas no que foi contratado, com o integral atendimento às obrigações reciprocamente assumidas (boa fé objetiva).

Essa nova roupagem do consagrado princípio da boa-fé importa em uma conduta honesta, leal e correta por parte dos contratantes. Passa a ser uma espécie de regra de conduta e um dever de agir de acordo com determinados padrões sociais estabelecidos e reconhecidos, tendo como base um padrão de conduta comum, do homem médio.

Esse comportamento deve existir não só apenas no decorrer do contrato, mas também na fase pré-contratual (fase de tratativas) e na pós-contatual, sendo que, em nenhuma dessas etapas, deve prevalecer o intuito de prejudicar o outro contratante ou tomar proveito de sua inferioridade econômica, intelectual ou social, para fins de obter vantagens indevidas.

É justamente no campo da responsabilidade pré-contratual que se percebe a importância do princípio da boa-fé objetiva, especialmente porque pode acontecer que, após uma longa fase de tratativas e troca de informações por parte dos futuros contratantes, inclusive com ônus para um deles, o negócio jurídico, por culpa, desinteresse ou comodidade de um dos contratantes, não venha a ser celebrado.

Nessa hipótese, seria extremamente injusto que todos os investimentos, planejamentos e custos suportados por uma das partes fossem completamente desconsiderados.

Nesse contexto, ainda que as partes não venham a assinar o contrato, seja de Franquia, Transferência de Tecnologia, Cessão de Direitos Autorais, Licença de Marcas, entre outros, consegue-se, à luz do novo Código Civil, compelir o contratante que não agir com lealdade e honestidade desde os primórdios do relacionamento, incluindo-se aí as primeiras reuniões, troca de minutas, a pagar os prejuízos causados à parte que atuou com honestidade e boa fé durante aquele tempo.

A boa-fé objetiva é o espelho da conduta dos contratantes e deverá refletir em todas as etapas (antes, durante e depois do contrato) a honestidade e a lealdade que se espera das partes envolvidas.

Sendo a boa-fé objetiva um preceito de mão dupla, ambas as partes devem realizar o máximo esforço para aumentar, incrementar e impulsionar a relação contratada, com a certeza de que seus objetivos são convergentes e próprios para o fim que se busca, e que jamais retratarão uma injustiça, desigualdade ou desequilíbrio, capaz de prejudicar um contratante em proveito do outro. Mesmo porque, "os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé… " (art. 113); e "também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos costumes" (art. 187).

Mais do que nunca passa a ser fundamental, diante de eventual litígio, examinar o tipo de relacionamento e o objeto do negócio que está sendo executado pelas partes, pois, ainda que não exista contrato assinado, podem emergir uma série de obrigações para cada um delas que, na hipótese de descumprimento, ensejarão o dever de indenizar.

É o caso de franqueadores que mantém com empresas um relacionamento tipicamente de franquia, sem, no entanto, assinar o Contrato de Franquia. Em dado momento, se deixarem de cumprir suas obrigações, poderão ser obrigados a cumpri-las e também a ressarcir os prejuízos porventura causados aos "franqueados".

Ainda sobre o tema, ganham especial destaque as cláusulas de não concorrência, que traduzem uma obrigação pós-contratual e que, a partir de agora, também deverão ser fielmente cumpridas e respeitadas pelos contratantes após a vigência do contrato. 

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Marcelo Mazzola

Socio, Advogado, Agente da Propriedade Industrial

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