por Eduardo de Mello e Souza
01 de junho de 2009
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O cenário econômico que estamos vivendo vem exigindo de gerentes soluções criativas para manter suas empresas líquidas. Uma dessas soluções é usar os ativos intangíveis da empresa como uma forma não-monetária de garantia, assim livrando a carteira de bens tangíveis para eventuais negócios. Os regulamentos no Brasil permitem o uso de propriedade intelectual (PI), tais como patentes, marcas registradas ou trabalhos protegidos pela Lei de Direito Autoral, como garantia em uma ampla gama de operações. O problema normalmente encontrado é como avaliar esses bens.
As abordagens tradicionais para se avaliar PI levam em consideração seus custos, comparáveis de mercado ou fluxo de receita esperado. Essa é uma análise complicada na melhor das hipóteses, exigindo boa compreensão do bem e do contexto que o cerca, bem como previsões bem-embasadas acerca do que o futuro reserva.
Considere as avaliações de patentes, um campo relativamente novo no Brasil, mas que vem amadurecendo em economias desenvolvidas, o que é exemplificado por negócios como o leilão, realizado pelo Ocean Tomo, da US 6,618,593 (uma patente voltada para dispositivos de telecomunicações) por US$ 2,6 milhões. A maioria das patentes novas não são inovações radicais, mas sim invenções incrementais, melhorias realizadas sobre produtos pré-existentes. Como se sabe, patentes dão ao seu proprietário o direito de impedir que outros usem o aperfeiçoamento protegido, mas não necessariamente o direito de fabricar o produto em si – para isso, ele precisaria do consentimento de todos os outros detentores de direito sobre aquele produto. De forma geral, avaliações de patentes são um exercício em três partes, em que se precisa, em primeiro lugar, saber a extensão dos direitos do inventor sobre o produto subjacente, para, então, analisar implementações alternativas conhecidas e, por fim, avaliar o produto subjacente com e sem o uso da invenção para verificar o valor potencial da patente.
O desafio na avaliação de PI para seu uso como garantia é dissociá-la de seu proprietário, de forma que, caso essa garantia seja requerida, o credor – ou contraparte equivalente – esteja apto a ser ressarcido do valor esperado ao vender o bem. Infelizmente, isso não é tão simples quanto parece.
Tome-se como exemplo a avaliação em US$ 100 bilhões da marca ‘Google’ recentemente feita pela Millward Brown. O que aconteceria se a Google de fato vendesse sua marca a uma hipotética (e desconhecida) "Empresa de Buscas na Internet – EBI"? Depois de certo tempo, a Google teria que oferecer seus serviços sob um nome novo. A EBI usaria agora a marca Google e a própria Google operaria, por exemplo, sob a marca "Search". O que aconteceria então? Isso depende do desempenho da EBI. A princípio, as pessoas continuariam a digitar desavisadamente www.google.com nos seus navegadores, mas, agora, em vez dos resultados da Google, obteriam os da EBI. Se a EBI fizer um bom trabalho, as pessoas continuarão a usar a página, mas todos acabariam percebendo que a "Google" não é mais a mesma, embora a "Search" seja. O valor da marca "Google" mudaria gradualmente para refletir o desempenho da EBI, assim como o valor da "Search" se ajustaria. Em outras palavras, o mero fato da EBI comprar a marca "Google" muda o valor esperado desse bem.
Ao se considerar o uso de PI como garantia, é importante identificar inicialmente quais características geradoras de valor o bem possui por conta própria – tais como receitas vindas de licenciamento ou se é de especial interesse para determinado setor da indústria. Somente então se deve iniciar o exercício de avaliação. Uma boa avaliação também levará em conta o efeito sobre o valor da PI do fato dela ter sido oferecida como garantia, assim como características do credor que possam vir a afetar o valor do bem, caso ele acabe em suas mãos.
Em última análise, como acontece com qualquer bem real, o valor com que a PI será aceita como garantia está sujeito a negociação entre as partes. Um bom relatório de avaliação dará uma base para essas discussões na esperança de se acelerar a chegada a um consenso.