por Nicolle Grimaud
10 de agosto de 2020
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O cadastro obrigatório de empresas no domicílio eletrônico judicial está previsto no artigo 246,§1º, do Novo Código de Processo Civil, que assim determina: “Art. 246, § 1º – Com exceção das microempresas e empresas de pequeno porte, as empresas públicas e privadas são obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais serão efetuadas preferencialmente por este meio.”
Embora a ideia de uma plataforma unificada seja excelente e muito bem-vinda para nós advogados e jurisdicionados, não se tem certeza de quando entrará em efetiva operação. Como adiantado pelo próprio Conselho Nacional de Justiça, em um primeiro momento entrarão em funcionamento a Plataforma Nacional de Editais e o Diário de Justiça Eletrônico Nacional (DJEN) que, aparentemente, já estão em teste.
Apenas em um segundo momento é que será desenvolvida a ferramenta eletrônica para citação de pessoas jurídicas, chamada Domicílio Eletrônico. A previsão, de acordo com informação obtida junto ao CNJ, é que isso ocorra no segundo semestre de 2020.
Supletivamente, como estabelecido pelo artigo 196 do CPC, diversos Tribunais vêm utilizando plataformas (como, por exemplo, ESAJ, PROJUD, EPROC), a fim de possibilitar às pessoas jurídicas o cadastramento para recebimento de citações e intimações de forma eletrônica.
Por vezes, a realização do cadastro é simples e exige a utilização de certificado digital e cópias de determinados documentos. No entanto, em alguns Tribunais, o cadastramento exige, além disso, o comparecimento à Serventia para finalização, ou confirmação dos dados informados, o que acaba reduzindo o número de empresas dispostas a se cadastrarem.
Assim, embora o cadastro seja obrigatório na grande maioria dos Tribunais brasileiros, por não haver previsão de penalidades processuais muitas empresas deixam de realizá-lo, seja pela dificuldade acima apontada, seja porque aguardam a efetiva implementação da Plataforma de Comunicações Processuais pelo CNJ, de forma a evitar “retrabalho”.
No entanto, como forma de compelir as empresas que ainda não se cadastraram perante os Tribunais a fazê-lo, algumas medidas foram tomadas pelos Tribunais de Justiça do Mato Grosso e do Rio de Janeiro. Todos os demais Tribunais, até onde se tem notícia, não preveem qualquer tipo de sanção para quem não realizar o cadastro.
Recentemente, o Tribunal do Mato Grosso publicou nova Portaria Conjunta 291/2020 estabelecendo a obrigação do cadastro das empresas no sistema de processos eletrônicos daquele Tribunal, para fins de recebimento de citações e intimações eletrônicas. Até aí, nada novo. A novidade estava inserida no art. 2°, que trouxe recomendação para que os magistrados avaliem a possibilidade de aplicação de multa às pessoas jurídicas que não realizarem o cadastro. A justificativa para a medida é a violação ao princípio da cooperação e a possível caracterização de litigância de má-fé por resistência injustificada e ilegal ao andamento do processo.
O TJRJ, por sua vez, valendo-se da prerrogativa do Poder Público de reduzir as possibilidades de contágio do Covid-19, sendo a medida mais eficaz para minimizar a disseminação do vírus a restrição de circulação e aglomeração de pessoas, aliada à natureza essencial da atividade jurisdicional, a necessidade de sua continuidade e a existência de número significativo de pessoas jurídicas que ainda não se cadastraram no Sistema de Cadastro de Pessoas Jurídicas, condicionou o peticionamento inicial, ou intercorrente, à realização do aludido cadastramento dentro do prazo de 15 dias, contados do dia dezoito de maio de 2020.
Embora existam manifestações no sentido de que o direito à ampla defesa e ao contraditório não pode ser ignorado em detrimento do novo procedimento estabelecido, razão pela qual, as empresas não cadastradas deverão continuar recebendo as citações e intimações pela via postal, especialmente porque as citações e intimações deverão ser preferencialmente por meio eletrônico (art. 246 § 1°, CPC), o CNJ expôs o entendimento de que “a ausência de sistema nacional do Conselho Nacional de Justiça permite que os tribunais, localmente, desenvolvam os seus sistemas de comunicação oficial de atos processuais, nos termos da legislação processual civil. Se assim não fosse, os tribunais estariam impedidos de dar cumprimento ao disposto na Lei n° 11.419/2016, que versa sobre a informatização do processo judicial”.
Em adição à citação acima – extraída do acórdão proferido no Pedido de Providências n° 0006460-03.2018.2.00.0000, de relatoria do Conselheiro Valtércio de Oliveira, movido contra os Tribunais de Justiça do Amazonas, Roraima e Acre -, o CNJ entendeu que a intenção do artigo 196 do CPC e de sua Resolução 234/2016 foi centralizar as comunicações processuais eletrônicas para facilitar a prestação jurisdicional, mas não inviabilizar a comunicação na ausência da plataforma prevista.
Destacou-se, ainda, que ao CNJ “é permitido realizar o controle de legalidade dos atos administrativos, só podendo desconstituí-los quando infringirem a lei em sentido estrito ou os princípios da administração pública”.
Diante disso, acreditamos que o entendimento acima pode ter a interpretação ampliada (com cautela), de forma a abranger, por exemplo, a condicionante imposta pelo TJRJ para compelir as empresas a se cadastrarem. No entanto, em uma análise preliminar, nos parece ilegítima e desarrazoada a aplicação de multa recomendada pelo TJMT, na medida em que não se tem conhecimento das causas e circunstâncias que levaram a pessoa jurídica a não efetivar o cadastro, além de existirem outras modalidades de citação e intimação da parte para além da via eletrônica.
Nossos clientes, afetados pelo regramento acima e que atuam em diferentes segmentos empresariais, possuem, como é de se esperar, diversos perfis que vão desde aqueles que com o início da vigência do Novo Código de Processo Civil, em 2015, mobilizaram-se para providenciar o cadastro em cada um dos Tribunais que o possibilitaram, passando por aqueles que optaram por se cadastrar somente perante os maiores Tribunais do país e os que deixarão por realizar o cadastro somente após a criação da Plataforma de Comunicações pelo CNJ.
E para viabilizar o cadastro levando em conta as exigências específicas de cada um destes perfis, desenvolvemos mecanismos que abrangem o monitoramento da implementação do sistema pelo CNJ, o estreito acompanhamento de novas deliberações e exigências formuladas pelos Tribunais, análise da documentação dos clientes e auxílio para que o cadastro possa ser realizado de forma rápida e efetiva.
Assim, não tendo sido disponibilizada até o momento a Plataforma de Comunicações pelo CNJ, mas havendo ferramentas implementadas individualmente por cada Tribunal, possibilitando que as empresas efetivem seus cadastros para fins de recebimento de citações e intimações eletrônicas e, ainda, observada a recente tendência de levar a cabo a obrigatoriedade do cadastro através da aplicação de sanções, nossa recomendação é firme para que os cadastros sejam realizados perante todos os Tribunais que eventualmente os tenham disponibilizado, o que demonstrará a boa-fé dos envolvidos e o espírito colaborativo, facilitando e otimizando a prestação jurisdicional.