27 de maio de 2025
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Ministro Cristiano Zanin oficia a OAB sobre uso indevido de IA em petição com precedentes inventados
No dia 12 de maio de 2025, o Ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), oficiou o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) após constatar o uso inadequado de inteligência artificial (IA) na elaboração de um recurso. O uso inadequado da IA se deu em uma Reclamação Constitucional com pedido de liminar, ajuizada contra decisão proferida pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).
No acórdão proferido por Zanin, relativo ao julgamento da Reclamação Constitucional, consta que o Ministro, ao analisar o caso, verificou que as decisões citadas como proferidas nos autos do Agravo Regimental no Agravo em Recurso Extraordinário nº 1.218.084, bem como nos Recursos Extraordinários nº 464.867/SP e nº 328.111/DF, não existiam. Constatou, ainda, que a petição continha declarações falsas sobre o acórdão do Recurso Extraordinário nº 226.855/RS. Verificou-se também que o conteúdo indicado como correspondente à Súmula Vinculante nº 6 não condizia com o texto real da referida súmula.
O Ministro Zanin informou que todas as páginas do recurso julgado apresentavam uma marca d’água com os dizeres “Criado com MobiOffice”, aplicativo que, conforme consulta realizada pelo próprio Ministro, oferece um assistente de escrita com IA generativa.
Diante desses elementos, Zanin concluiu que o advogado utilizou ferramenta de IA generativa para redigir o recurso, sem realizar qualquer tipo de revisão humana posterior. Para o Ministro, o uso acrítico da tecnologia resultou na inserção de jurisprudência inexistente e no uso indevido de enunciado vinculante, comprometendo a integridade do documento. Ele afirmou: “Esse fato, aliado às citações de julgados inexistentes, assim como afirmações falsas sobre o conteúdo de súmula vinculante e acórdão desta Suprema Corte, permite concluir que o advogado subscritor da exordial possivelmente usou ferramenta de inteligência artificial na elaboração da petição inicial e, sem nenhuma revisão posterior, de forma temerária, protocolou-a no Supremo Tribunal Federal.”
Por considerar que a conduta poderia configurar violação ao Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/1994), Zanin determinou a ciência da OAB para adoção das providências cabíveis. Ainda, entendeu que o comportamento se enquadra como litigância de má-fé, destacando que o autor “age de forma temerária, falseando a existência de precedentes vinculantes, em demanda proposta perante o Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 80, V, do Código de Processo Civil.”
Cabe observar que o Conselho Federal da OAB publicou, em 14 de novembro de 2024, a Recomendação nº 001/2024, que estabelece diretrizes para orientar o uso de inteligência artificial generativa na prática jurídica. Entre suas disposições, destaca-se a orientação de que “o uso de IA generativa na prática jurídica deve ser realizado em conformidade com a legislação vigente, incluindo o Estatuto da Advocacia e da OAB, o Código de Ética e Disciplina da OAB, a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018), o Código de Processo Civil e respeitando a propriedade intelectual”.
O documento também assevera que “ao utilizar um sistema de IA generativa, o(a) advogado(a) deve garantir o uso ético da tecnologia, de modo que o julgamento profissional não seja realizado por meio de sistemas de IA generativa sem supervisão humana, não sendo delegada nenhuma atividade privativa da advocacia aos sistemas”. Além disso, recomenda que o(a) advogado(a) atue com transparência, informando o cliente “quanto ao uso que se pretende fazer de IA generativa, avaliando as limitações em cada caso concreto”.
A decisão pode ser acessada através do link: Rcl 78890
A Recomendação nº 001/2024 da OAB pode ser acessada através do link: https://diario.oab.org.br/pages/materia/842347